Templo egípcio em Madri
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September 16, 2015

Muralha da China

Muralha da China

Visitar a China sempre foi um sonho. Quando fui a Hong Kong, a trabalho, no ano 2000, decidi que não demoraria muito para conhecer a China. Mas demorei um pouco… Foi só em novembro de 2007, morando em Madri, que embarquei para duas semanas de descobertas pela China. Foram poucos dias para um país colossal, mas eu tinha um objetivo bem claro: conhecer a Muralha da China, que, ainda na infância, acreditava poder ser vista até mesmo da Lua. Claro que, naquela época, ir à China parecia algo tão difícil quanto a visita ao satélite da Terra, fato que certamente ajudou a alimentar esse sonho até a idade adulta.

Com seis mil quilômetros espalhados pelo território chinês, é natural que existam muitos pontos de acesso à Muralha da China. Beijing, no entanto, é o principal deles, tanto para visitantes estrangeiros quanto para os próprios chineses. Do centro da capital chinesa, uma hora e meia em ônibus levam os visitantes até Badaling, o ponto mais visitado da Muralha da China, pela proximidade com Beijing. Ainda do ônibus, observar os primeiros trechos da muralha em meio ao cenário montanhoso foi uma experiência emocionante. Desembarcar e descobrir que a Muralha da China é a atração mais visitada pelos próprios chineses foi, sem dúvida, uma das grandes decepções que já vivi em minhas experiências de viagens.

A impressão que tive, ao me aproximar dos portões de acesso para realizar a visita, é de que metade da população da China havia escolhido aquela data para visitar seu principal atrativo turístico. Claro, acompanhados dos turistas ingleses, franceses, canadenses, japoneses… Constatar que Balading está sempre cheia não chega a ser uma descoberta, é apenas uma decepção para a visitante que achou que, diante de seis mil quilômetros de muralha, teria algumas pedras apenas para si. Em Badaling, a sensação é de se chegar à “Disney da Muralha”. Há filas para entrar e para fotografar e só com a ajuda do Photoshop você estará sozinho na sua foto. Caminhar até alguma das torres de vigilância é uma espécie de peregrinação… Não pelo silêncio – que não existe – ou pela apreciação dos cenários, mas porque é impossível andar sem pisar no calcanhar alheio.

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Ainda assim, Badaling é possivelmente o trecho mais bem preservado da muralha, merecendo a visita. Fica 70 quilômetros ao norte de Beijing, a mil metros de altitude, e a partir de sua entrada – com portões rodeados de vendedores que assediam os visitantes – o turista começa a caminhada pela muralha, com opções à direita ou esquerda. A subida é mais fácil pela direita, mas a vista a partir do outro lado é ainda mais bonita. Preguiçosos podem dispensar a caminhada pelas pedras da muralha e escolher o teleférico. Sim, há até um teleférico em Badaling. Foi nesse trecho da muralha, também, que a instalação em comemoração aos Jogos Olímpicos de Beiijing, em 2008, foi colocada.

A muralha e eu

Mas há pontos menos “populares” na imensa extensão da muralha chinesa que vão agradar mais aos que preferirem conhecer esse Patrimônio da Humanidade da Unesco em uma versão menos turística. Foi o que fiz, com alguma dificuldade e um certo grau de risco. Trata-se de Simatai, a 110 quilômetros de Beijing, ou Jinshanling. É possível caminhar entre esses dois pontos, como fiz. São cerca de dez quilômetros de subidas e descidas que exigem algum preparo físico e muita disposição. O visual e a paz de estar sozinho em meio a uma das milhares de torres erguidas em toda a extensão da muralha valem todo o sacrifício. No percurso, trechos bem preservados, outros nem tanto, e alguns poucos vendedores com claros traços da etnia mongol oferecendo água e biscoitos.

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Tive de contratar um táxi que me levou a Jinshanling, onde comecei a caminhar. Apesar do frio diante do fim do outono chinês, o dia ensolarado me fez tirar o casaco depois da primeira meia hora de degraus acima. Foi só depois de mais de uma hora de caminhada que encontrei o primeiro visitante, caminhando no sentido contrário. Um pouco mais adiante, alcancei um casal canadense, que tinha Simatai também como destino. Caminhamos um pequeno trecho juntos, já que as pausas do casal não combinavam com o horário que eu tinha previsto para encontrar o mesmo taxista na outra ponta, garantindo o retorno para Beijing. Tive de me apressar.

Mesmo andando um pouco mais rápido, pude apreciar os cenários ao redor da muralha e as próprias pedras de sua construção. Foi para impedir a invasão dos antigos nômades do norte, região hoje ocupada pela Mongólia, que o imperador Qin Shin Huang, unificador da China, decidiu “construir” a muralha por volta de 220 a.C. Na verdade, Qin foi o idealizador da unificação das muitas muralhas já existentes em todo o norte da China, colocando cerca de um quinto da força de trabalho da época no megalomaníaco projeto. Questiona-se a real eficácia da muralha para impedir a invasão dos habitantes do norte, mas o certo é que a presença dos soldados nas torres espalhadas pelos seis mil quilômetros funcionaram como um eficiente meio de comunicação.

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Neste trecho, torre de vigilância ruiu quase completamente

Em muitas dessas antigas torres, descansei. Fiz paradas curtas, mas frequentes. Foram pouco mais de quatro horas para enfrentar os dez quilômetros. Encontrei mais alguns estrangeiros fazendo o trekking no sentido contrário e em uma difícil conversa com uma vendedora mongol achei entender um “alerta” por estar viajando sozinha. Mas ela podia estar apenas dizendo que não gostou do meu casaco. É impossível qualquer tentativa de interpretação.

De qualquer modo, não recomendo qualquer tipo de trekking desacompanhado. Os riscos vão de assaltos e agressões – justamente pela pouca presença humana nos locais – a machucados ou graves acidentes. Mas essa caminhada ou, ao menos, a visita a algum desses portões da muralha, é mais que recomendável. Ao chegar em Simatai, é preciso atravessar uma passarela pênsil, sobre o rio e uma represa. Dá vontade de seguir o caminho pela muralha, mas meu taxista estava, como combinado, me esperando nos portões de Simatai. Duas horas e meia depois, chegava sã, salva e completamente realizada a meu hotel em Beijing.

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Em Simatai, mapa mostra alguns dos percursos possíveis pela muralha

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Única foto “não-selfie” feita no trekking, com a ajuda do casal canadense

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